Birdman ou ( A Inesperada Virtude da Ignorância)

Título Original: Birdman or (the unexpected virtue of ignorance)
País: EUA
Direção: Alejandro González Iñárritu
Roteiro: Alejandro G. Iñárritu, Nicolás Giacobone, Alexander Dinelaris e Armando Bo
Elenco Principal: Michael Keaton, Edward Norton e Emma Stone
Estreia no Brasil: Fevereiro de 2015




Há poucos meses, antes de saber da existência de Birdman, eu falava com amigos a respeito do congestionamento de super-heróis que se instalava em Hollywood. Mal se acaba uma trilogia já se inicia um remake da mesma. A quantidade de filmes dos super dotados é tão grande que muitos abandonam o gênero específico para se fazer comédias com os heróis, vide Os Vingadores de Joss Whedon. Aparentemente, Iñárritu já havia percebido esse fato bem antes de mim e levou a discussão para dentro do universo artístico, com todas as suas inseguranças, produzindo uma comédia satírica que, ironia do destino ou não, pode ser um dos grandes premiados do Oscar 2015. Mas com todo merecimento.

Com um roteiro escrito a oito mãos, o longa acompanha a trajetória de Riggan Thompson (Keaton), figura então consagrada no cinema com a fictícia trilogia do super-herói Birdman, na tentativa de se reerguer artisticamente dirigindo e atuando uma desafiadora peça teatral na Broadway. Desafiadora por ser uma adaptação de um conto de Raymond Carver supostamente inadaptável, pela substituição há dias da estreia de um dos atores pelo magnífico e complicado Mike Shiner (Norton) e pela perseguição do público e crítica que esperam sedentos por um fracasso de Riggan.

Admirável constatar como o aclamado diretor mexicano consegue trazer todo seu talento para fora de sua zona de conforto. Muito diferente de seus trabalhos marcantes no cinema (Amores Perros, Babel e Biutful), essa comédia negra não contém histórias cruzadas e narrações não lineares, mas sim uma narrativa direta que profundamente aborda as questões que já descrevi no primeiro parágrafo. O roteiro coloca sempre em perspectiva o protagonista e seu alter-ego, o homem-pássaro que não admite a atual situação que o abdicou da fama que seria filmar o Birdman 4. Com uma atuação magistral de Keaton que transparece o drama daquele ator que, para ter o sucesso como tal, deve deixar de ser ele mesmo, ao passo que sua atuação como Birdman seria capaz de confundir o espectador, tamanha a diferença de postura atribuída aos dois personagens por Keaton.

Para comunicar à audiência a urgência da situação de Riggan os diretores utilizaram um número de técnicas que envolve o público naquela atmosfera dos bastidores e trás à tela o dinamismo do teatro. O trabalho do diretor de fotografia Emmanuel Lubezki, muito lembrado pelo recente Gravidade, estabelece as filmagens de tal forma que tudo parece feito de uma única e imensa tomada, sendo quase que imperceptível os pontos de cortes. É como se estivéssemos flutuando naquele universo, só a observar os conflitos daquelas personagens.

Por falar em conflito, uma cena que tomo como memorável do longa, mas que pode passar despercebido ou subestimada por muitos, é a discussão entre Riggan e a crítica de teatro que ameaça acabar com a peça antes mesmo de assisti-la. A beleza aqui está na força do argumento de ambas as personagens. Enquanto o ator é figura viva de tudo o que ela odeia na pretensiosidade das estrelas de blockbusters, ele atenta para o fato de que o crítico está sempre blindado dos riscos e abusa dessa posição. Excelente reflexão.

Assim Iñárritu fecha seu raciocínio com um ato final que se divide em dois sub-desfechos, digamos. O primeiro, após a "tragédia" ocorrida no final da estreia da peça e a mídia idolatrando o resultado, comicamente conclui que o sucesso tão almejado por Riggan veio justamente quando ele não mais interpretava mas sim vivia a si mesmo no palco. Não alcançando seu objetivo real, e vendo seu "fracasso" dar nome a um novo gênero teatral, o segundo desfecho então surge e se dá com uma certa ambiguidade, deixando ao espectador interpretar acerca de quem era e quem é agora Riggan Thompson.

Independente do que possa dizer um ou outro sobre o que realmente ocorre na cena final, os olhares admirados de sua filha Sam (Stone) mostram que Riggan finalmente é visto como sempre somente ele mesmo conseguia enxergar, o Birdman.


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